Sim, é triste. Os saudosistas dirão: “eu lembro dos gloriosos momentos da Eletrobras!”. Mas, por mais dura que seja a realidade, a Eletrobras acabou. O balanço de 2015 com um prejuízo de R$14,4 bilhões não deixa dúvida: a empresa virou uma gestora de ativos podres. Se fosse uma empresa privada, estaria falida – mas, como é controlada pela União, fala-se em injetar mais R$7 bilhões. É como dar oxigênio a um defunto: o prejuízo em 2012 foi de R$6,9 bilhões; em 2013, de R$6,3 bilhões; e em 2014, de R$2,9 bilhões. Somando-se ao de 2015 chegamos a assombrosos R$30,5 bilhões! Seriam os R$7 bilhões, então, exatamente para quê? Conseguir pagar a conta de telefone?
Einstein dizia que “não há sinal maior de loucura do que fazer a mesma coisa várias vezes e esperar um resultado diferente”. Pois bem: o modelo atual acabou. Fim. Não funciona. E não adianta colocar 7, 10 ou 30 bilhões: ano que vem, novos prejuízos virão. E o motivo é simples: a empresa tem sido usada, ao longo dos últimos 8 anos, como instrumento de controle de preços do setor elétrico. Exemplos? O leilão de Belo Monte, onde todo o mercado já sabia que o preço-teto ofertado era inexequível. O governo ordenou que Chesf e Furnas liderassem dois consórcios distintos, na bizarra situação de uma empresa concorrendo com ela mesma e ofertando deságios, para simular que houve algum interesse. Em transmissão ocorreu o mesmo: de 2008 a 2012 as empresas do grupo Eletrobras abocanharam 43% das receitas dos leilões. Quando em 2013 elas foram impedidas de participar, pois acumulavam atrasos absurdos (Chesf tem 1.100 dias médios de atraso; Furnas, 1.400), 50% dos lotes deram “vazio”. Isso porque, claramente, os valores-teto também eram inexequíveis – e só a Eletrobras os aceitava como corretos, em detrimento do interesse dos minoritários. Na Medida Provisória 579/2012 (aquela que baixou as tarifas em 20,2%) a empresa foi novamente forçada a aceitar preços que eram completamente desfavoráveis (inclusive, tendo sido multada pela CVM por conflito de interesses, já que o governo federal, controlador da Holding, foi quem bolou a proposta). A receita é tão ruim que a Eletrobras até apresenta, em seu balanço, o resultado das concessões renovadas pela MP579 em separado (para tentar mostrar que, no final das contas, há alguns negócios que são piores do que os outros).
É necessário destacar que a empresa possui um corpo técnico extraordinário, que não concorda com os rumos que a empresa tomou. Afinal, que bom profissional gosta de ser subordinado a um chefe que só está lá por indicação política? Que bom profissional gosta de ver a empresa para a qual trabalha fechando repetidos prejuízos, e atrasando obras que custarão bilhões de reais ao país, por não conseguir atender à demanda de energia elétrica nacional?
A privatização da empresa é a única – reforça-se: única – solução para acabar com o problema. E não adianta o discurso de “choque de gestão”: mesmo que ela passe a ser administrada com uma “visão de mercado”, isso também é ruim, pois continua com o (grave) problema de conflito de interesses, onde o poder concedente cria regras e a empresa controlada por ele pode se beneficiar de informações privilegiadas (até porque, em geral, os conselheiros da empresa são do Ministério de Minas e Energia). Como o nosso modelo de expansão é baseado no financiamento privado (como deveria ser, mesmo), é óbvio que, seja pelo controle de preços (se administrada com uma visão de governo), seja pela informação privilegiada (se administrada com uma visão de mercado), a empresa causa distorções concorrenciais ao setor elétrico nacional (e a constituição é clara, em seu artigo 173, parágrafo 4º: “A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados e à eliminação da concorrência”).
Vender o controle da Eletrobras é garantir a expansão do sistema elétrico nacional, é devolver ao mercado a definição de preços justos, é avançar para onde começamos a caminhar em 1995 e paramos em 2003. Isso não quer dizer que perderemos o controle do setor: a ANEEL continuará com seu trabalho de definir as regras, de forma independente e técnica. A única diferença é que, após a privatização, os (eventuais) prejuízos caberão apenas ao investidor, e não mais ao povo (que já tem contas suficientes a pagar no final do mês, e não precisa pagar a conta dos outros).